
Chegar a um cargo que nunca foi ocupado por alguém de sua etnia ou gênero não é uma novidade para Kamala Harris. Quando chegou à procuradora-geral da Califórnia, foi a primeira mulher e a primeira pessoa negra a assumir o posto.
Também foi
a primeira mulher negra a ser senadora pelo estado, a segunda no país. E, neste
ano de 2020, ela se tornou a primeira mulher negra e a primeira pessoa de
ascendência indiana a compor uma das chapas dos principais partidos americanos.
Mas o
resultado das eleições nacionais deste ano levou ela a lugares antes
inimagináveis. Com a vitória de Joe Biden projetada pela CNN, Kamala Harris
será a primeira mulher a assumir como vice-presidente dos Estados Unidos,
estando mais perto do Salão Oval do que nenhuma outra já esteve.
E mais. Nos
EUA, o vice-presidente -- ou, agora, a vice-presidente -- é também a pessoa que
preside o Senado Federal. Portanto, outro posto em que Kamala vai substituir o
republicano Mike Pence após a vitória.
"A
minha presença aqui é um testemunho dedicado às gerações que vieram antes de
mim," disse Harris durante seu discurso de aceitação na Convenção Nacional
Democrata, em agosto.
Ela foi a
terceira a compor uma chapa presidencial. Antes, Geraldine Ferraro concorreu na
chapa democrata em 1984 e Sarah Palin foi a vice do republicano John McCain em
2008.
Kamala
Harris, origens e posições políticas
Kamala
Harris passou sua infância em um dos berços do ativismo de esquerda
norte-americano: Berkeley e Oakland, onde nasceu em 1964.
Sua mãe foi
uma pesquisadora de câncer e seu pai, que é de ascendência jamaicana, um
professor de economia.
Ambos
participavam do movimento dos direitos civis e Harris, junto com sua irmã mais
nova, Maya, que presidiu sua campanha presidencial, cresceram em um ambiente de
ativismo.
Kamala
Harris é uma figura vista como moderada dentro do Partido Democrata, que muitas
vezes se vê entre diferentes alas da agremiação.
Seu passado
como promotora a colocou muitas vezes na linha de tiro dos grupos mais à
esquerda entre os democratas, que veem na justiça criminal um meio para
reforçar desigualdades.
Por outro
lado, ela tem posição dura em diversas questões econômicas, tendo tido um papel
importante em negociações por indenizações cobradas de instituições financeiras
em razão da crise das hipotecas de 2008.
Kamala
Harris também se coloca como uma defensora de programas sociais e de uma
ampliação da ação estatal na promoção dessas condições.
'Nós
estamos na cédula'
Harris é
uma pioneira em sua jornada para a Casa Branca, e os eleitores notaram.
"Agora
eu sinto que meninas negras como eu podem ser presidentes do grêmio, meninas
negras como eu podem ter grande reconhecimento, como ela tem," disse Paris
Bond, de 14 anos, para a CNN em agosto.
Katerina
Shadrach, uma menina de 11 anos descendente de sul-asiáticos, disse à CNN em
agosto de 2019 que Harris era sua inspiração. Dentro de um ginásio lotado,
Shadrach estava em pé na platéia de um comício ao lado de seu pai, Sheldon,
segurando a biografia de Harris, "The Truths We Hold" (As Verdades
que Possuímos, em tradução livre), enquanto esperava a senadora que se parecia
com ela subir no palco
A menina
aspira em ser uma senadora nos EUA. Ela disse à Harris depois do evento sobre a
sua ambição de traçar um caminho como o da política. De acordo com Katerina,
Kamala a disse que "contanto que ela colocasse em sua mente seu objetivo,
que fizesse o melhor que eu possa e seja a melhor versão de si mesma, será
capaz de alcançar seus sonhos".
Ao ver
Harris em uma cédula de eleições presidenciais um ano depois, Shadrach chamou o
momento de "um passo muito grande" para meninas e mulheres que se
parecem com ela.
"Foi
ela quem conseguiu provar que é realmente possível", disse a menina.
"Você pode ter uma conexão, porque somos duas pessoas parecidas. Então se
ela pode chegar lá, eu também posso. E eu consigo me identificar com ela."
Ou como
Leah Daughtry, que liderou as convenções democratas de 2016 e 2008, disse sobre
Harris para o The New York Times: "Ela é uma representante das mulheres
negras. Nós estamos na cédula".
Kamala e
Biden
Para os
planos presidenciais de Biden, Kamala Harris cumpriu uma série de objetivos.
Diante dos
protestos contra a desigualdade racial, a escolha de uma pessoa negra. Enquanto
ele é um homem idoso, ela é uma mulher mais jovem. Em resposta às críticas de
que Joe Biden não seria firme contra a criminalidade, o histórico dela serviu
de atestado de antecedentes.
O fato de
ela ter se colocada como pré-candidata a presidente em 2019 também contou. Ao
lado de um candidato que, aos 78 anos, será o mais velho a tomar posse, havia a
avaliação de ser necessário uma pessoa mais jovem, mas que tivesse se colocado
à disposição da Presidência.
A primeira
aproximação de Kamala Harris e Biden veio durante as negociações com os bancos
em 2011. Nessa época, Beau Biden, filho do ex-vice-presidente, era o
procurador-geral de Delaware e Kamala, a da Califórnia. Os dois ficaram muito
amigos.
“Nós nos protegíamos um ao outro”, escreveu Harris sobre Beau Biden em um livro de memórias de 2019. “Havia períodos, quando eu estava no centro dos ataques, em que Beau e eu conversávamos todos os dias", lembra Harris, “às vezes várias vezes ao dia”.
Confronto
no debate
Durante o
período em que Kamala se colocava como pré-candidata a presidente, ela chegou a
ter um sério desentendimento com Joe Biden em um debate entre os pretendentes
democratas.
Kamala
Harris disse que não considerava que o ex-vice-presidente fosse racista,
"mas foi doloroso ouvi-lo falar sobre dois senadores dos Estados Unidos
que construíram sua reputação e carreira na segregação racial".
A fala, evocando menções antigas de Biden a parlamentares que eram contrários ao fim da segregação racial nas escolas americanas, gerou rusgas. “Eu estava preparado para todos me atacarem”, disse Biden à CNN na oportunidade. “Mas não para a pessoa que me atacou do jeito que me atacou. Ela conhecia Beau, ela me conhece."
Os dois
dizem que as rusgas foram superadas, mas elas foram consideradas até os últimos
momentos antes do anúncio da escolha de Kamala como vice.
Via CNN